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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Revista de História - Drinques e Parcerias. Por Vivi Fernandes de Lima

"A humanidade está sempre três uísques atrasada”, diz a máxima do ator de Hollywood Humphrey Bogart. Para comprovar a veracidade desta afirmativa, basta observar como os bebedores, a partir de um certo tempo em volta da mesa, são capazes de propor soluções para todos os problemas do mundo. Sim, todos. Talvez por isso volta e meia um novo livro sobre a cultura dos bares aparece nas prateleiras das livrarias. Guias, contos, romances...

Lugares onde a criatividade anda à solta, os bares do Rio de Janeiro sempre tiveram um cantinho especial na história cultural da cidade, reunindo artistas e ilustres “filósofos”, como os escritores João do Rio, Vinicius de Moraes e Antônio Maria. Estão aí o Bar Vilariño, o Bar Luiz e o Bar Brasil, que não deixam ninguém mentir. E a música popular brasileira deve muito a esses bares. Nesses espaços nasceram canções e parcerias, que são exaltadas até hoje, como Tom & Vinicius e Vadico & Noel Rosa. É este clima de boemia musical que a peça “Na rotina dos bares”, de Marcos França, apresenta no palco da Sala Baden Powell até 4 de dezembro.

De cara, o espetáculo começa com uma canção que é praticamente um hino da cidade, “Rio antigo”, de Chico Anysio e Nonato Buzar (“Quero um bate-papo na esquina/ Eu quero o Rio antigo com crianças na calçada...), fazendo referências também a pontos de encontro da boemia carioca, como o Café Nice. Em cena está Chico (interpretado por Antônio Pedro Borges), um boêmio que fica desolado ao encontrar o Café Bar Lamas de portas fechadas em 1976, por causa das obras do Metrô no Largo Machado. É aí que ele começa a se lembrar dos botequins que frequentou e de suas interessantes companhias.

Como um bom frequentador de botequim, Chico é também um bom contador de histórias, que podem não ser verdadeiras. Afinal, ele foi amigo de toda a boemia carioca dos anos 30 aos 70. Foi ele, por exemplo, quem apresentou Noel Rosa à Ceci e viu o poeta da Vila ficar com o coração despedaçado com o romance de sua amada com Mário Lago. Verdade ou mentira? Os dois. A biografia de Noel é muito clara com relação a este triângulo amoroso, isso é fato. Mas Chico é uma invenção do autor teatral. “É um personagem que por vezes inventa a sua biografia. Em sua fantasia tudo pode ser permitido”, diz Marcos França, que também está em cena.

Pelos bares da vida

Por meio da memória do protagonista, o musical “Na rotina dos bares” traz um bom panorama de como a história do Rio de Janeiro se entrelaça de uma forma muito especial com a história da música popular brasileira. Os cinco atores – além de França e Borges, estão Édio Nunes, Letícia Medella e Sheila Matos – se desdobram em diversos personagens. Dirigidos por Ana Paula Abreu, interpretam Carmen Miranda, Noel Rosa, Dolores Duran, Antônio Maria, Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Nara Leão, Elizeth Cardoso, Zé Keti... Todos eles vivendo intensamente os bares de seu tempo. Estão lá Café Nice, Cassino da Urca, Lamas, Bar Luiz, Zicartola, Vilariño, Vogue, Bar Veloso, o animado Beco das Garrafas e o Cabaré Apollo. E cada um deles tem em suas histórias capítulos que formaram a MPB.

No Vilariño, por exemplo, Vinicius de Moraes foi apresentado a Tom Jobim, e juntos fizeram as músicas da peça "Orfeu da Conceição", de 1954. Até hoje o bar preserva na parede uma fotografia que reúne boêmios de renome: Vinicius, Paulo Mendes Campos, Fernando Lobo e Lúcio Rangel estão entre eles. Ao fundo, a lembrança do que seria um grande registro para a história do Rio de Janeiro: a antiga parede com desenhos dos frequentadores como Di Cavalcanti, versos de Neruda e até acordes de “Aquarela brasileira”, de Ari Barroso. Numa véspera de Natal, o dono do bar simplesmente resolveu deixar o estabelecimento mais limpo, e pintou as recordações. O jornalista e compositor Fernando Lobo chegou a chamar o episódio de “atentado” no livro “À mesa do Vilariño” (Ed. Record). A importância do lugar, ele expõe com clareza: “A boemia desta cidade durante as décadas de 50 e 60 se juntou sem encontro marcado, na mesa comum do Bar Vilariño”. E lá estava também o personagem Chico, por que não?

Tratando o passado recente de forma, ao mesmo tempo, divertida e nostálgica – afinal, Chico é movido pela saudade – o espetáculo traz, além da história desses lugares e de seus frequentadores, um repertório impecável. Sob a direção musical de Fabio Nin, os atores cantam acompanhados pela banda em cena. E não é pouco: são 24 canções costuradas em um roteiro que preserva a leveza do tema, mas sem cair no oba-oba, apresentando os protagonistas da nossa história musical com a seriedade que eles merecem.

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